sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Imperdoável

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Queria te odiar só por um segundo.

Odiar muito, ódio de verdade,

ódio de sangue,

ódio que vem da alma!

Aquele ódio que aquece por dentro do corpo,

que enche de lava as cavidades da face, que seca a boca e embaralha a mente e embaça os olhos e franze a testa e cria milhões de rugas novas por segundo e que dá vontade de esganar, enforcar, espancar, escarrar, chutar, xingar, assassinar…

Mas não consigo!


Queria te odiar só por um mísero segundo,

Só um segundo, unzinho…

Mas não consigo!


Perdôo-te por tudo,

menos por isso.
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terça-feira, 27 de janeiro de 2009

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- sou tão, mas tão desastrado
que derrubei essas palavras (sem métrica!)
nessa folha amassada.
perdão, foi sem querer, eu juro!
não foi por nada.
prometo que vou me calar.

oh, mil perdões, derrubei também
alguns impropérios,
mas já vou recolher!
juro que esse “filho da puta!”
não é pra você.
vou catar essa “merda” que deixei cair,
deixarei tudo limpo,
já vou me omitir!
(como convém)
desculpa mesmo,
juro que não quis
incomodar ninguém.

- mas já incomodou, moleque pentelho!
pensas que é poeta? te olha no espelho!
és só um fedelho, que menino feio!

- desculpa, perdão,
me poupe o sermão
prometo que vou
recolher o refrão!

- recolha então!

- não recolho não!

- recolha senão
não te dou um tostão!

- recolho então,
e peço perdão,
ponho-me no chão,
não me deixe mão!

- te dou um vintém:
largue a poesia!
cansei de te ver
nessa vida vadia.
o bolso furado
dinheiro não tem
se quer ser poeta,
que seja, amém!
mas já não espere
por nenhum trocado
seguirá vazio
teu bolso furado.

- desculpa então,
me poupa o sermão,
prometo que vou
recolher o refrão.

- recolha então!

- não recolho não!

- recolha senão
não te dou um tostão.

- recolho então,
e peço perdão,
ponho-me no chão,
não me deixe mão!

- pois pára com isso,
moleque atrevido
se continuar
te dou um castigo!

- ah, castigo não!
versei sem querer,
caíram os versos,
não pude conter.
tentei segurar
mas eram tão lisos!
jogavam-se loucos
mirando o piso.
portanto: foi mal!
não fiz por querer!
juro, algo igual
não vou mais fazer!

- não faça, senão
não vou esquecer.

- desculpa, perdão,
me poupe o sermão
prometo que vou
recolher o refrão!

- recolha então!

- não recolho não!

- recolha senão
não te dou um tostão.

- não recolho não,
nem peço perdão,
não quero tostão,
me basta a canção.
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sábado, 24 de janeiro de 2009

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O suicídio é a maior das tentações
no mundo da superinformação
que desinforma e deforma
de forma que as normas respondam
à uma lógica ilógica e
anti-ecológica.
Não há saídas e
embora os caminhos sejam vários
parecem dar todos no mesmo
lugar e apesar de toda
perseverança e esperança
é sempre mais fácil encher a pança
com uma boa picanha e
uma cerva gelada,
afinal, a vida anda tão complicada
que pensar é penoso e
perceber é chorar.
Melhor me vendar.
Melhor me vedar.
Melhor me vender.
Melhor me dopar.
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quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Sem Título 2

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Tem um ás balançando
lá embaixo

- beeem lá embaixo -

e o castelo está condenado.

-Salve-se quem puder!

Ninguém pode. O primeiro andar está em chamas e,

além disso,

ninguém quer.

São todos loucos.

***

Um brinde aos que permanecem.

Os quartos estão queimando, a estrutura está ruindo, o calor é infernal…

Mas jogamos fora os pára-quedas!

Um brinde de vinho e cicuta (não muita)
que é só pra doer (mais um pouco)

ainda não é a hora.

Um brinde aos que permanecem
e sabem

que

ainda não é a hora.
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segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Poema de ano novo feito no começo do ano passado e postado ligeiramente atrasado

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Brindemos ao porteiro,
Enclausurado em sua cabina,
Ouvindo os fogos orgulhosos,
Ruidosos como carabinas

Brindemos à enfermeira
(pelo menos já está vestida de branco)
Espera ansiosa os resultados
Das primeiras violências do ano

Brindemos também ao motorista da ambulância
Brindemos ao motorista do ônibus, do táxi, do avião
Brindemos ao manobrista do puteiro de luxo
Ao barman do Hilton Hotel

Brindemos! Ergamos nossos copos para celebrar a moça do pedágio, a balconista da conveniência, os mendigos do centro antigo, os doentes terminais, os presos brindando com suas cachaças artesanais, o traficante sorteado para fazer plantão na hora dos fogos.

Ah, os fogos!
(sempre tem um coitado que leva chumbo na hora dos fogos)
Quantos aparelhos de TV não estão ligados, enlatando o céu colorido e fedido de pólvora?
Quantos ouvidos não ficarão parcial ou completamente surdos?
Quantas queimaduras? Algum incêndio, quem sabe…
Quantos cachorros e gatos não se escondem embaixo das camas, amedrontados?

Os fogos!
(Brindemos aos bombeiros)

Brindemos, brindemos ao primeiro segundo da meia-noite!
Brindemos o primeiro assassinato do ano, onde será? E o primeiro estupro?
O primeiro contrato fraudulento a ser assinado? O primeiro enfartado a morrer na frente de toda a família, entupido de pernil e cerveja? O primeiro jovem a morrer de overdose? A primeira traição, a primeira agressão, a primeira delação, a primeira broxada?

(Brindemos ao rapaz da farmácia 24 horas)

E o primeiro assalto, será que demora?
Brindemos ao policial que fará a primeira detenção do ano.
Brindemos os brindes mais esquecidos, mais ignorados, mais desprezados, mais repulsivos!

Viva!

Brindemos ao suicida
Que esperou paciente o encontro dos ponteiros
Para chutar a cadeira e começar o ano com classe.
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